sexta-feira, 13 de setembro de 2013

EU COMPRO UMA REVISTA


O jovem sentado no banco da praça ouve a conversa de outros jovens no banco da frente... enquanto isso, as pombas giram pelo céu e pousam, em grupos e separadamente, bebem água no chafariz e ciscam migalhas pelo chão da vida, esta dimensão fugaz onde o tempo passa sem parar. O sol reflete na água do pequeno lago, fazendo lâminas, devolvendo luz ao céu que brilha azul, sem nuvens. Entre pontos cintilantes, as tartarugas espiam o mundo do lado de fora, amontoadas, e outras nadam entre kinguios branco-alaranjados e carpas dançarinas, que nada mais fazem nesta tarde do que hora para a morte, como os jovens que conversam e se beijam na minha passagem.
Eu, compromissado, creio estar seguindo a um lugar exato... creio ter função nesta roda, ora samsárica, ora sistemática e monetária, e quase sempre quando ando penso se vivo ou sou vivido pelos lugares em que vou e não gosto, pelas coisas que quero e que não posso, pelo que quero demais. Há sempre um futuro, escondido num outro lugar que ainda não veio, mas nem sempre há um destino. No entanto eu vejo e também observo
[o que talvez seja mais importante

eu vejo e também observo os arredores deste corpo andante. Na parte norte dos bancos há um gramado e algumas plantas, arbustos, piracantas, uma sica deveras revoluta, gigante e descabelada, como o cara que toca seu violão na calçada por onde passo agora. Então o ritmo constante de minhas pernas com chegada certa me leva pra fora da praça e outros minutos ficaram para trás. Eu compro uma revista, eu vejo pessoas que eu (acho que) conheço e cumpro ações de uma lista, costurando esquinas, reconhecendo outra vez a cor do dia, que passa rápido e parece feroz.
Há um cachorro cheirando a rua por onde andam também centenas de pessoas, constante passar. Há dois, há quatro, há dez cachorros marginais. Há também em uma loja um cachorro de pelúcia verossímil, uma boneca inflável para companhia e solidão... Há, no segredo dos apartamentos, o domínio inefável dos amores sobre outros amores
[se é do amor o domínio, a supressão e o mando).

Quem sabe o amor não seja assim tão puro, pois aquilo que mais amo é também minha maior prisão, a ferida mais frágil e aberta, a possível maior ruína.

***

Eu volto sempre pelo mesmo caminho. Quando chove, sob um conjunto de marquises, eu desvio das gotas insistentes e salto as poças pelo chão. Elas refletem uma mulher de guarda-chuva colorido... elas refletem qualquer coisa, imitando a vida antes do sol secá-las. Tolas poças, tão finitas quanto ela, a vida. Estagnadas pela gravidade e pelo tempo da cidade úmida.
Espelhando algo que não são, às poças eu dedico esta pequena história que parece não ter fim, só meio. E de fato, vivemos entre os meios, buscando inutilmente como tudo começou, esperando um fim, andando pela praça e ruas, seguindo os mesmos caminhos por dias diversos...
Talvez o fim fique na frente... talvez o fim nem há. Ou vivamos apenas de fins... vários e incessantes fins... fins que se unem uns aos outros num permanente transformar... uma intrigante e rápida eternidade, como o espaço-tempo entre dois bancos de praça por onde passo, novamente, agora.

Um comentário:

Luma Elora Aislin disse...

Adorei Duda...
nós tão perto...e eu nem sabia das tuas pérolas geodésicas,me criticam aqui em casa, pelo habito de guardar e selecionar jornais, até que corra meus olhos e veja se é coisa boa de ler e foi assim, entre meus guardados que achei a matéria no diário,fiquei muito feliz, rsrsrsrs...vou ficar assídua e roubar-tei fragmentos, kkkkk que espalharei como bençãos.....
bjusss em ti, na Mariana e nas crias lindas!

Luma Elora Aislin/Lúcia Neutzling