quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

TABACARIA


(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folhas de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)

Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, sem rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.

HORA DE SER CRIANÇA


O cara tentou me ofender dizendo que eu pareço uma criança...

HORA DO VOO


Vai 2009
Ano louco
Gregorianamente incerto...

Mas um marco
Onde descobri
Minhas verdadeiras gaiolas...

21º GP MARANGUAPE


Sem sombra de dúvidas ele era um ás no volante.

O OUTRO LADO DO ESPELHO


Onde vai dar o outro lado do espelho?
Ilusória pedra, água plana
Mostra o que existe e que não vejo
Inclusive minha cara insossa
Meu grande nariz...

Abre a porta
Deixe entrar para além do tocável
A ilusão-real
Que é o que não parece
E que perece, se não estou...

Quebra-se o espelho
E em cada caco um pedaço da verdade
Uma cara de deus

Rasga-se o couro com teu cortante olho
E dentro da pele existe outro alguém
Um espelho de sangue
Uma alma além...

CLARA DIFERENÇA ENTRE O HOMEM E O SOL


O Sol, com certeza, acordará pela manhã...

UM RABISCO


Rabisco o dia, escrevo hoje o que pouco sei... A noite vira a página da vida e eu penso como posso ser melhor...
Se existe melhor, é algo que não toco. A felicidade é o agora pleno; é desejar o que se tem... e eu busco, como meta, realmente compreender isto...
Outro ano se passou... Fragmento a vida em anos, dias, natais... Ontem mesmo já não lembro e o amanhã, quem dirá onde estarei?
Sinto aromas... vejo cores... e isto me concede a clara percepção de que ainda existo. Mas existo onde? Em que dimensão? Serei eu apenas sonho de alguém que é meramente sonho também?

Que sonhemos! Enquanto durmo, o mundo pára.

CIDADEZINHA QUALQUER


Casas entre bananeiras
Mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.

Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.

Devagar... as janelas olham.

Eta vida besta, meu Deus.

Carlos Drummond de Andrade

O VOSSO TANQUE, GENERAL, É UM CARRO FORTE

Derruba uma floresta esmaga cem
Homens,
Mas tem um defeito
- Precisa de um motorista

O vosso bombardeiro, general
É poderoso:
Voa mais depressa que a tempestade
E transporta mais carga que um elefante
Mas tem um defeito
- Precisa de um piloto.

O homem, meu general, é muito útil:
Sabe voar, e sabe matar
Mas tem um defeito
- Sabe pensar

Bert Bretch

COMO A VIDA...


Um dia
sob o céu azul de Setembro
silenciosamente, debaixo de uma ameixeira,
envolvi-a
[à minha pálida amante]
em meus braços,
como num sonho belo,
encantador.
Acima de nós,
no lindo céu de verão
uma nuvem atravessou-me o olhar.
Branca, muito branca
alta, muito alta
leve, insustentavelmente leve.
Ao entardecer, olhei novamente. Desaparecera.
Simplesmente. Sem deixar qualquer vestígio.

Bert Bretch

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

TEOREMA DO TUNTI-TUNTI


A qualidade da música é sempre inversamente proporcional à qualidade do equipamento sonoro.

***

Eu nunca vi o som de um carro estourando um Chico Buarque ou um Djavan...

MONUMENTOS ESTRANHOS

Andei arrolando e enrolando, durante minha estada em Santa Rosa, a tera da caroça, alguns monumentos estranhos pelo mundo.

HOMENAGEM A CAIO PINTO

Caio Pinto foi um cara muito bacana, cheio de filhos. Parece-me que eram mais de 50 (os conhecidos) e que ele tornara-se símbolo de fertilidade masculina, embora a vizinhança o achasse símbolo de chifrudo masculino. O fato é que ergueram, em Pau Grande-MG, uma estátua para homenageá-lo.

O CHEIRA-CU

A estátua do Cheira-cu está localizada na praça central de Bundkor, cidade do Uzbesquistão, perto de Kosovo e longe do Peru. Ela homenageia um menino, de nome incerto, mas que era da família Rego, com toda certeza.

O HOMO-EMA

O homo-ema é a espécie a ser homenageada por este protótipo aí em cima. Será colocado na praça dos 3 Poderes, em Brasília, porque dizem que lá os colarinhos-brancos vivem escondendo a cara. Viva o Brasil!

O PEGA-PÉ

Homenagem às sogras da Bulgária, o Pega-pé simboliza a mania internacional da mãe dos cônjuges de bisbilhotar, periquitar e pipipizar na vida dos genros e noras do mundo.
Já mandei fazer uma cópia tamanho P pra dar pra Lena.

SAPATEIRO

Pra finalizar, essa aí é de Pelotas. Está sendo construída no Navegantes para homenagear o maior sapateiro do mundo, meu compadre Alexandre Mattos Meireles, vulgo Zapata.

sábado, 26 de dezembro de 2009

POTCHUA BABULENKA


A vida é como um filme: quando termina, se aplaude.
Quem fica na sala, há de compreender (e compreender é diferente de aceitar) que a grande brincadeira, muito rápida, por sinal, nunca termina: apenas recomeça em outra medida.
Te amamos vó. Prepara um pão com cebola aí no espaço que logo logo eu tô chegando...

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

CAIXÃO DE LUXO

Belíssima prisão...
O cadáver dele deve estar confortavelmente podre.

FELICIDADE


Felicidade é desejar aquilo que já se tem.

O FRACASSO DA COP15


O capitalismo mostrou mais uma vez que é incapaz de resolver os
problemas que ameaçam a humanicdade. A maior reunião diplomática da
história, a 15ª Conferência do Clima (COP-15) terminou num retumbante
fracasso. Milhões de pessoas que dependiam de uma decisão importante
para enfrentar o aquecimento global foram abandonadas à sua própria
sorte. “A cidade de Copenhague foi palco de um crime, com os culpados
correndo para o aeroporto perseguidos pela vergonha”, resumiu um
ambientalista do Greenpeace.
A conferência, que reuniu quase 200 líderes mundiais durante duas
semanas, sequer fixou algum tipo de meta para diminuir as emissões dos
gases estufa, responsáveis pelo aquecimento global. O único documento
apresentado pela conferência – que não prevê metas obrigatórias de
redução de emissões de CO2 até 2020 – não terá o menor valor jurídico,
pois é apenas uma carta de intenções.
O acordo foi assinado apenas pelos chefes de estado da União Europeia,
Estados Unidos, China, Índia e África do Sul. O Brasil também assinou,
apesar de o presidente Lula ter dito horas antes que estava frustrado
com as negociações. Parte dos países africanos, além da Bolívia e da
Venezuela, não assinou o documento, num claro sinal de protesto.
Mas Copenhague não só fracassou no objetivo de estabelecer um acordo
mundial sobre o clima. Também significou um retrocesso mesmo diante
das tímidas ações já feitas para enfrentar o aquecimento, como o
Protocolo de Kyoto, o único acordo climático mundial com valor
jurídico.
Kyoto estabeleceu metas insuficientes para conter o aquecimento,
pedindo que países industrializados diminuam em 5,2% a quantidade de
gás carbônico jogada na atmosfera em relação aos índices medidos em
1990. Mas segundo os cientistas do Painel Intergovernamental de
Mudança do Clima (IPCC) é preciso reduzir a emissão dos gases estufa
pela metade. Mesmo estabelecendo compromissos rebaixados, os EUA se
recusaram a cumprir as metas de Kyoto. O simples fato de o
imperialismo não aderir às metas já tinha provocado a falência do
acordo. Agora, em Copenhague, uma pá de cal foi jogada sobre o que
restou do protocolo.

Pobres sofrerão mais

O imperialismo norte-americano é o principal responsável pela atual
catástrofe ambiental. Sozinhos despejam pelo menos 20% de todos os
gases estufa na atmosfera. Mas a transformação da China (segundo maior
poluidor mundial) numa plataforma de exportação imperialista aumenta
ainda mais a degradação ecológica.
Hoje já é possível perceber os efeitos das mudanças climáticas
causadas pelo aquecimento. Neste ano, eventos climáticos extremos
ocorreram na América do Sul, Ásia e Austrália. No Brasil, as enchentes
no Nordeste, que aconteceram entre março e maio, e as que ocorreram em
outubro e novembro em Santa Catarina podem ser consideradas anomalias,
bem como a seca que atingiu o sul do país e o norte da Argentina no
início do ano.
Mas os maiores desastres ocorreram onde vivem as parcelas mais pobres
da população mundial. De acordo com o IPCC, cerca de 250 milhões de
pessoas sofrerão com a falta de água na África, com uma redução de até
50% na produção agrícola em alguns países até 2020. O mesmo pode
ocorrer com regiões inteiras da Ásia, afetando mais de um bilhão de
pessoas.
Já na América Latina, a previsão aponta para a desertificação de
regiões mais secas, como a caatinga e o serrado. Cientistas também
avaliam que 40% da floresta amazônica poderá se transformar numa
região semiárida. Algo que terá profundas consequências no conjunto do
clima do planeta. O IPCC ainda diz que o nordeste do Brasil pode
perder 70% da recarga de seus aquíferos.
No entanto, há uma diferença nisso tudo. Apenas os países
imperialistas poderiam promover as profundas adaptações que a mudança
climática vai exigir. Podem, por exemplo, impedir que suas cidades
sejam devastadas pela elevação dos oceanos. Um exemplo é a Inglaterra.
Por muito tempo, Londres, que se encontra praticamente no nível do
mar, sofria inundações quando chuvas prolongadas ou o brusco
derretimento da neve coincidiam com marés altas, afetando o volume de
água do rio Tamisa, que corta a cidade. A solução foi a construção, em
1982, de um sistema de comportas para regular o fluxo das marés. Com a
ameaça de uma elevação do nível dos oceanos, estuda-se agora a
construção de um novo sistema para impedir qualquer ameaça de
inundação.
Mas os países semicoloniais não possuem recursos para tal adaptação,
uma vez que suas riquezas são espoliadas pelo imperialismo. É um
delírio achar que Bangladesh (ex-colônia britânica, um dos países mais
pobres do mundo afetado por constantes enchentes) possa construir um
sistema de comportas como o de Londres. Uma pequena elevação dos
oceanos pode ter consequências catastróficas para esse pequeno, mas
populoso país asiático.
Por outro lado, os países semicoloniais também enfrentam a degradação
ambiental provocada por multinacionais e grandes corporações. A
África, por exemplo, se tornou uma espécie de aterro sanitário do
imperialismo e das multinacionais. Lixo radioativo na Somália, derrama
de produtos tóxicos junto à Costa do Marfim, mais de 5 mil litros de
cloro abandonados nos Camarões são apenas alguns exemplos que tornam o
continente o destino de uma boa parte do lixo tóxico do mundo.

Falência do desenvolvimento sustentável

Copenhague também demonstrou a falácia do chamado desenvolvimento
sustentável. As propostas de desenvolvimento sustentável tentam
conciliar o que, na verdade, é impossível: crescimento econômico e
lucros dos capitalistas com preservação ambiental. Essa proposta
insere-se no marco da defesa de um capitalismo ecológico, com rosto
humano. Mas o capitalismo não pode superar a crise que provocou, pois
isso significaria impor limites aos lucros da burguesia.
No marco deste sistema predatório e de concorrência entre os
burgueses, é impossível que o capitalismo possa utilizar tecnologias
racionais e não poluentes, uma vez que sua adoção é infinitamente
menos rentável para os capitalistas. Qualquer proposta de cunho
reformista estará fadada ao fracasso, como se pode ver hoje com o
Protocolo de Kyoto.
Por outro lado, a sustentabilidad” – como tudo no capitalismo –
tornou-se mais uma forma de se ganhar muito dinheiro. Os chamados
créditos de carbono movimentam hoje US$ 120 bilhões e estão se
tornando numa oportunidade para especuladores ganharem muito dinheiro
enquanto o planeta agoniza.
O discurso da sustentabilidade também pode ser utilizado para preparar
grandes derrotas. No Brasil, a maior defensora da sustentabilidade é a
ex-ministra do Meio Ambiente
Marina Silva, pré-candidata à presidência da República pelo Partido
Verde. Sob o discurso da sustentabilidade, Marina aprovou leis que
permitem alugar as florestas públicas brasileiras para empresas
privadas e ONGs (Projeto de Gestão de Florestas Públicas para a
Produção Sustentável). Ou seja, a chamada sustentabilidade colocou
toda a nossa biodiversidade da Amazônia brasileira à mercê dos
empresários, inclusive os estrangeiros. Também foi sob seu ministério
que foi liberado o cultivo da soja transgênica, além das obras da
transposição do Rio São Francisco.
Copenhague é a demonstração cabal de que a lógica predatória e de
concorrência entre os burgueses impossibilita que o capitalismo crie
algum tipo de desenvolvimento sustentável, pois isso seria menos
rentável para os empresários. A bandeira ecológica insere-se na luta
pela superação completa do regime de exploração. Ou o capitalismo é
superado ou a humanidade seguirá para a barbárie e o ecocídio.


Jeferson Choma
da redação do Opinião Socialista

sábado, 19 de dezembro de 2009

PERCEBO ou VERSÃO ZEN DA TEORIA DA GOTA NA TESTA


Um jovem discípulo perguntou a um mestre zen
[dentre tantas outras perguntas metafísicas, filosóficas e existenciais

qual era o sentido da vida. Então o mestre respondeu: Eu não tenho nada a te esconder.
O discípulo não compreendeu momentaneamente aquele argumento, porém não insistiu e saiu para seus afazeres.
Dias depois, durante uma caminhada pelos jardins, mestre e aluno passaram por uma ramada de glicínias floridas.
Podes sentir este perfume? - inquiriu o sábio.
Sim, respondeu o jovem discípulo.
Então o mestre lhe falou: Estás vendo!? Eu não tenho nada a te esconder.

E o discípulo se iluminou.

UM DIA

A vida é mesmo
Um momento absorto
Se amanhece vivo
Se anoitece morto.

TODA COR


Toda cor surge de uma interação harmônica perfeita entre a luz e a retina. Cada matiz reparado é, na verdade, a perfeição exata e dinâmica de todas e cada tonalidade, que faz as primas e as secundárias e as terciárias etc... Assim, o que seria do verde se não fosse o azul e o amarelo? O que seria do branco, que é todas, se não fosse cada uma? Qual sentido teria o vazio do preto não fosse o cheio da palheta divina? E das cores, se não fosse o preto?

***

A mente pré-concebe: rosa é cor de mulher; preto é isso; branco é aquilo; verde é das matas... conceitos deveras restritos de um universo amplo, que existe por si só.
Na verdade, as cores existem para quem pode vê-las.

TEXTO GRIPADO

Atchim saúde obrigado de nada eu que agradeço disponha.

TAMBÉM FILHO


Quando vejo que tu queres colorir o céu
Teu sorriso de criança:
Giz-de-cêra da vida...

Quando chamas
Acende a chama da minha atenção
Canta as novas, diz bom-dia
Pra ti eu não tenho nome.

E vai, filho meu
Cresce... o mundo é tão pequeno
E eu respiro um horizonte
Tão legal...
Estar contigo é mesmo massa.

PSICOMUNDO


Quem domina a mente, domina o mundo.

CÚMULO DA IMPERTINÊNCIA

Pertinente mesmo é não ser impertinente.

JANELA DE TINTA


Escrevo
Como quem desocupa uma gaveta velha
Retiro as meias, pequenos bibelôs
Uma carta de amor...
Te mando flor
Te digo tudo, muito mais
Do que eu mesmo creio

Espeto a faca,
Corto a língua flácida da palavra
Boca-muralha, viaduto expresso pela mão

E no papel
Claro lugar onde desnudo fico
Construo ideais castelos
E espio o mundo
Por uma janela de tinta.

DODAVID

Feliz mesmo é o filho da Gisele, que a essa hora deve estar mamando.

FALÁCIAS ONOMATOPÉICAS


Ele chegou pisando forte BAMBAMBAM e tocou a campainha: PLING-PLÓN. Repentinamente, apareceu o gato do vizinho e MIAUUU. Aquele MIAUUU atraiu um doberman que RAURAURAU saiu em perseguição atrás do pobre moço, fazendo com que ele tropeçasse BAM num toco no chão e caísse sobre as latas de lixo BALALAM.
Foi então que o vizinho acordou, acendeu a luz, parou na janela e atirou três vezes com sua carabina: PAU. PAU. PAU. As balas passaram zunindo pelo ouvido do rapazote: ZIN, ZIN, ZIN, que se jogou no rio TCHUM-BUM e teve que fugir a nado para não ser encontrado.

MÁXIMA POBREZA

Eu conheci um cara tão pobre, mas tão pobre, que só tinha dinheiro.

A HISTÓRIA

A história é uma coisa muito ultrapassada.
A moda agora é o agora.

A LAS PUCHAS

A las puchas
A las puchas não: a La outra
A la outra não: a la misma
A La misma não: a las puchas.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

SARAMAGUÊS


Se Romeu tivesse os olhos de um falcão, provavelmente nunca teria se apaixonado por Julieta.

BONECA MATRIOSCA


Quantas faces dentro
Obsoletas pelas circunstâncias
Reservadas, como se não fossem
Auto-explicativos todos os teus atos

E tua boca santa
Entre o beijo e a ira
Dizia coisas, bem de dentro vinham
Como as tuas caras,
Anônimas e vorazes,
Que aparecem pouco entre os dias...

Mas quem de fato te conhece
Vê-te uma, vê-te todas
Pois o que és liga teu imo
A todas tuas aparências...
E era eu quem não te via
Entre os dedos que te modelavam...

PRIMITIVO ROSAURO


Ele achava que ninguém no mundo tinha o nome mais feio que o seu... Na real, sua mãe, quando o chamava pela rua, parecia sempre brava. Parecia... ela era uma mulher bacana, a dona Lorena, o nome de seu filho, Primitivo Rosauro, é que soava como um xingamento.
Os amigos, pequenas e cruéis crianças, zombavam de Rosauro pela feiúra do nome. Feiúra tão intensa que sujava a cara, fazendo com que aquele menino fracote, mas meiguinho, ficasse feio também. E isso foi pela vida afora, em todas as fases, aquele nome
[Primitivo Rosauro
foi, na verdade, uma condenação... uma prisão pertpétua.
***
Não arrumou namorada... não conseguia se apresentar em público... Não queria ver seu nome em nenhuma lista de universidade ou concurso federal... guardou a sete-chaves sua genialidade musical apenas para nunca ser famoso...
Ele não se olhava no espelho... não tinha fotos dos pais... não foi batizado, nunca se casou... não organizou eventos nem lançou negócio algum que pudesse revelá-lo, de alguma maneira, à sociedade que, mesmo quieta e inerte ao seu anonimato,
[o melhor dos anonimatos

o ameaçava pelo simples fato de existir.
***
E quando morreu, já velho, seu nome fora timbrado na lápide e o acompanhou pelos idos, enquanto existisse memória.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

MINHA CALÇA NOVA


A minha calça nova é tão bonita que eu não vou usá-la nunca.

ASSINTAGMÁTICA

Criou ela uma vontade de chorar
Que já não entendia mais palavras
Tudo o que era ordem se perdeu
Como se chovesse dentro,
Como se o ar a espreitasse...

Mas não foi fogo, não foi nada
Era o tempo construindo estrada
[uma infinda estrada
Que dava em lugar nenhum
E que não dava pra ninguém passar...

E enquanto há chuva na janela
Entendeu que o certo era passageiro
Como todas coisas que sua mente desenhava
E desejou ficar-se nu
No mar
Entre os portos.

TODA RELIGIÃO É MORTA

A fé não torna o indivíduo diferente do que ele realmente é, apenas mais cínico quanto ao mundo a seu redor. A religião é um artifício para enganar a vida e para aproximar o ego do indivíduo de um fator que ele denomina deus, ou “seu deus”.
O amor é a única religião: dele todas as coisas derivam e a ele todas retornam. Ele é a causa e o efeito da existência; a liberdade dos conceitos; a não-dogmática, pois cada pensamento restringe o todo, e cada restrição é uma forma de medo.

sábado, 12 de dezembro de 2009

PEQUENA FÁBRICA DE ESTRELAS


Pequena fábrica de estrelas
Jogando luz no universo preto
Buscando a matéria-prima do que somos
Que a alma vai até o esqueleto...

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

O QUE SE QUER VER?


Infinito reflexo de espelhos
Aonde vão meus corpos em fuga?
Todas as coisas se ressaltam, multiplicam
A luminária ao chão...
A janela translúcida...

Quando sonho, não me vejo
Talvez até nem faça parte dos meus planos
Pois o que penso tem limites
E ao dormir, já não sei quem sou...

***

Acendeu uma vela na varanda
O vento, brando, permitiu-lhe a chama
E pela sombra clara, tilintante,
Desenho na brisa dançante
Rastro do mundo que saiu do escuro

Aquela luz já era boa
[embora pouca

O que, de fato, precisamos ver?

A BOCA DA FORMIGA


A formiga cabeçuda
Come o mundo em migalhas
Que tudo é pequeno para sua voraz boca
[incomensurável boca

Ainda bem que formigas não falam...

FLORES MORREM DE VERDADE


Morri
Faz 15 anos que não piso aqui
E o que restou, algumas fotos
Lembranças poucas...
Quem me conhecia, já esqueceu
E o que juntei coube numa caixa
As outras coisas, a elas pertenci.

***

Morri agora
Faz bem pouco
Aprendi aquilo que eu não sabia...
Cada vez que aprendo, morro àquilo que cria
Muitas mortes tive, tantas eu terei
Sem lágrimas, só flores
Pois flores sim, morrem de verdade.

A TROMBA E O RABO

Ele se achava estúpido
Olhando no retrovisor
Um espelho de ilusões
A começar por sua cara estranha...

Depois da cara,
Um mundo que não alcançava
Um tato distante,
Mera memória

O elefante tem mais tromba do que rabo
E ele, naquela gorda estrada,
Queria mais curvas...
Muitas mais...

ZZZZ

Como pode um mosquito fazer tanto barulho?

CM

A vida se mede em largura, não em comprimento.

PESSOA

Quem questiona as pessoas
Muito mais pessoa é...

domingo, 6 de dezembro de 2009

LIRA AO JOÃO


Cai a chuva lá de riba
Tamborilhando no chão
Eu canto, que o peito canta
Na lira do coração
Cantemos, que a vida passa
Como chuva de verão...

LEMBRANÇA À CRÍTICA


Meus cumprimentos a todos aqueles que, de um jeito ou de outro, não me ajudam pra nada!

MINHA MÃE ADOLESCEU


Minha mãe adolesceu. E adolesceu gravemente. O doutor disse que às vezes é normal, nesta faixa etária. Terceira idade é fogo, diz ela.
Reparei que vários amigos dela adolesceram também... E muitos estão adolescendo numa velocidade crônica. Dizem que visitas são bem-vindas, que proferir atenção faz bem para estes idosos que adolescem, mas eles não aceitam chá: gostam mesmo é de uma cervejinha gelada. O que fazer? Já trabalharam muito, deram muito gás na vida (e continuam dando, né mãe?)... agora, que entraram na terceira idade e adolesceram, vamos deixá-los fazer o que quiserem.
Podem sair... voltar de madrugada... dançar, agitar, viajar e muitos outros ar... Aproveitem, porque após adolescer nunca se sabe o dia de amanhã...

Se é que antes se saiba...

PAVLOVIANICE


Vejo minha face refletida no riacho... Aqueles olhos, que obeservam tudo e me transformam narrador do que entendo vida, agora brilham, numa transparência insípeda que, sobre as pedras e folhas se desenha.
O que tenho é pouco, é o próximo suspiro. É o ar imenso que preenche o tempo do mergulho, uma linha reta que separa o calor do corpo do gelo do mundo. E penetro a cara momentaneamente quieta, de olhos cerrados, e desapareço na quadridimensionalidade que absorve tudo.
O caminho do rio é leste, é baixo... E ando como ele: fazendo de conta que nada acaba...