quinta-feira, 9 de outubro de 2008

ALMAR


O que quero pra mim é calmaria. Não quero que os ventos soprem meu cabelo ou as páginas do livro que leio silenciosamente numa tarde divinal. Quero ouvir os pássaros cantando enquanto acordo o beijo de meu filho... quero pessoas educadas, que freqüentem meu lar em amizade harmoniosa e pura. Quero poder andar descalço pela praia, tocar a água e beber de uma cascata... Quero poder chutar bola com a criança interior, numa perspectiva de que tudo anda, vagarosamente, sem precisar das horas. Imagino o sol do inverno brindando a pele e um fruto doce colorindo a boca, um olhar de anjo da mulher amada e um Quintana a deixar rastros de vida poética pra eu seguir...
Quero que a noite caia lentamente e a chuva bata na janela, como palmas pros meus sonhos. Quero regar as plantas do jardim e reparar nas aves que migram no caminho da tarde, desenhando formas entre nuvens brancas. Quero ouvir a música do Laranjal e ver cachorros brincando na singela alegria do não-desejo. E quero muito, muito mais... Mas o que quero é simples, e por sê-lo, parece tudo ilusão dentro da metrópole cinza. Parece que no ar que respiro e nutre a vida do meu corpo tem sujeira: a poeira dos outros. Parece que o que falam perturba, e não deveria, pois meus ouvidos (e olhos) são portas e só cabe a mim abri-las.
E me constranjo em saber que o mundo que perturba é a opção imediata que realizo e faço parte: sou a própria culpa que vejo nos outros, por não fazer o que de fato penso. Sou o próprio criminoso que procuro pelas ruas do meu dia...
Mas tudo bem... o ego cala e a tarde cai, da mesma forma, até o final dos tempos. O sol renasce numa rotação contínua do nosso planeta. Os anos passam enquanto giramos pelo cosmos. As Eras vão (precessionalmente) em direção ao nada, do nunca pro sempre... E, de carona, me calo a olhar pela janela.
Na verdade, a cada passo, passo. O tempo é curto para ser pequeno... é eterno para ser contínuo... e é exato pra ser questionado.

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