quarta-feira, 15 de outubro de 2008
PAVLOVIANAS
Faltava o que lhe era conveniente... sobrava sujeira naquele copo d'água... Ele levantava vagarosamente seu cadáver dormido da cama quente, alguns instantes após ligar a tevê com as novas de ontem... às vezes escovava os dentes, na projeção diária de que encontraria alguém que lhe valesse o bafo, às vezes não. Vestia-se nas feias vestes, repletas de furos dos ácaros famintos, que comiam pele morta, como ele fazia em suas ceias e jantares. Calçava as botas úmidas da água constante de Pelotas, e sempre saía de guarda-chuvas, como forma de tatear seu medo... medo de tantas coisas que, antes de viver, calava.
Passava entre os mesmos marcos de sua metódica história... cumprimentava as mesmas pessoas... pairava sobre o ritmo hipnótico e certo de seus passos que, ao passar pelas mesmas esquinas, rastreava seu cheiro sôfrego de escravo da vida...
Às vezes bebia, no banho cantava... tomava os goles do café, que se frio indiferente ante à pressa rumo ao nada, e empinava o dedo mingo ao céu. Comia doces e salames junto, pois pra ele seu corpo não passava de uma "fábrica de bosta". Ignorava o silêncio, como se o barulho lhe tornasse pleno, e falava coisas sem interesse às garotas da rua. Contava as moedas do cofre aberto pela ânsia imediatista e revelava segredos antes de dormir às paredes que ouviam tudo...
E antes de pôr o resto das vestes na mala, naquela que seria sua última viagem, deu comida aos gatos.
Sua última síntese terrena deixara num caderno velho, carcomido pelo tempo. E sua derradeira e metafísica síntese, que abrigava do seu existencialismo depreciativo à sua concepção neocapitalista, ainda desconheço... É que do éter pouca conclusão me chega... e se chegasse, me obrigaria a olhar nos olhos de minha própria idiotice refletida.
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