sábado, 13 de setembro de 2008

A AMANTE DO TARUMÃ


E tem o caso do português, que neste fato específico não é vítima de piada maldosa da fria vingança tupiniquim, se não um mero marujo explorador de mogno e pau-Brasil que em uma caravela lusitana fazia a ponte entre o seu sonho de fortuna no Novo Mundo e as tetas da Maria, em Braga. É que numa dessas visitas às novas terras do império, o referido português, cujo nome, se não me engano, era Manoel, como seu pai e seu avô também o foram, trouxe consigo um espelho redondo, desses que hoje se vê nos porta-coisas femininos, e olha que aquilo era só pelos idos de 1530, e o ofereceu à índia Iaúna em troca de seu sexo, já que ele, Manoel, não tinha, como a maioria de seus colegas, coragem para usar do estupro.
De Iaúna, o espelho caiu no riacho e, depois de meses perdido, foi encontrado por Tarumã, que naquela manhã procurava pelas piabas do rio de modo a cumprir sua missão de macho e alimentar sua prole, que já contava com quatro curumins e um por vir no ventre de Iracema, que por ora roncava de faminto. E Tarumã olhou o espelho. E se encantou. Achava ter descoberto uma pedra mágica, pois via ali refletida a cara do seu velho pai, o pajé Aririi. Na verdade, como ele, Tarumã, nunca havia se olhado antes num espelho, cria estar diante de uma imagem metafísica, uma porta ao além. Decidira, então, de pronto mostrar a tal pedra mágica pra sua Iracema, que conhecera seu pai Aririi e, certamente, se encantaria com tamanha magia.
Mas ao chegar na oca, que parecia com um ninho de joão-de-barro coberto por capim-manso, Tarumã não encontrou Iracema nem curumim algum... decerto haviam ido se banhar ou comer algumas amoras silvestres que nasciam perto da cachoeira, ou fazer algum cocar numa sobra de umbú. Ele, Tarumã, largou o espelho numa cumbuca e voltou à lida, já que tinha...
Iracema chegou em casa e viu, dentro da cumbuca, o espelho que Tarumã trouxera depois de encontrá-lo no rio em que o perdeu Iaúna que o tinha ganho de Manoel, o português com cara de cigano (isto eu não tinha dito: Manoel tinha cara de cigano sim, proveniente da genética do mundo, que circula independente das fronteiras). E Iracema, ao olhar-se refletida na pedra mágica, teve, naquele exato instante, a certeza de que comprovara, de forma inequívoca, a traição a que era submetida por Tarumã.
Tarumã tem amante!!! Pensara Iracema, não nestas mesmas palavras, nem neste mesmo idioma, por certo. Mas a essência do raciocínio foi justamente esta: Tarumã tem amante! E correu, claro, pra mostrar para sua sogra, a índia Jacutinga, que era uma praga com bigode e sempre, sempre defendia o infiel do Tarumã.
Aqui tá vendo Jacutinga? Eu sempre razão!!! Tarumã tem amante sim! Aqui prova concreta... Tarumã trai Iracema com safada aqui ó!!!
Jacutinga, que por causa da miopia (que nem desconfiava ter), pegou o espelho para ver a tal amante de Tarumã mais de perto. Qual foi sua surpresa em se ver diante do espelho (algo também novo para ela, e creio que para toda aquelatribo, com exceção de Iaúna para cá, dentro do que relatei, é óbvio), qual foi sua surpresa ao ver, de fato, que Tarumã tinha uma amante. Mas não deixou, como de costume das sogras indígenas, de tecer seu comentário:
Mas que trubufú!!!

Um comentário:

Carola disse...

nossa, encontrei teu blog muito por acaso, procurando o site do "templo das águas".
tu escreves muito bem, parabéns!
vou adicionar nos meus favoritos e voltar sempre pra ler.